Tuesday, August 13, 2013



 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

DE COMO O BISPO DE PORTUGAL AJUDOU NA CONTENÇÃO DOS TRÊS ESTANDARTES

 
O Senhor Presidente é um homem de muita fé. Só assim se explica porque impôs um acordo aos três Estandartes.

 
Anoitecera com uma trovoada medonha que fustigava, principalmente, a zona do palácio episcopal e D. Emanuel refugiara-se na sua capela privada, pois nessa noite sentia-se mais seguro perto do Senhor.
Ainda assim, o ferrolho da grande porta de madeira exótica fora accionado várias vezes, denotando pressa, ou ansiedade, ou aflição, de quem batera. Pudera, com uma noite como a que se desenvolvia, mais parecia andar o diabo à solta e, quem quer que fosse, estaria completamente encharcado.
D. Emanuel foi interrompido nas suas orações, para que a tormenta se fosse dali tão rápida quanto tinha vindo, pelo seu chefe de sacristia (o equivalente a chefe de gabinete de suas excelências os membros do Estado).
-Sua eminência dá-me licença que interrompa as suas orações… …apre que esta caiu no nosso pára-raios, apressou-se a dizer o chefe de sacristia, ao mesmo tempo que todo o edifício vibrava com o estrondo.
«Ó Salvador… há quantos dias cheguei a esta casa?».
Salvador fez aquela cara de menino apanhado a mexer nos chocolates: -pois é…, sua eminência…
«Deixe de me chamar sua eminência de uma vez por todas…, nas cerimónias litúrgicas e oficiais que seja… mas aqui dentro não… aqui dentro sou Emanuel…, entendeu de vez?!
-Entendi sim… …sua eminência…
«OK…, e o que há a esta hora da noite?…, o dia foi calmo e pacífico…, tirando aquela notícia dos juros a galoparem outras vez, enquanto os trastes brincam à política», perguntou D. Emanuel, denotando enfado e saturação com a casmurrice de Salvador, cónego e seu chefe de sacristia no episcopado.
-Chegou um correio do palácio do Senhor DeBolikeime, com uma mensagem urgente para sua eminênc… …para o Senhor D. Emanuel.
«Dê cá Salvador… … e pode retirar-se… boa noite».
Salvador, um coscuvilheiro nato, como há em todas as instituições…, até na Igreja Católica… … imaginem…, moveu-se em passo de caracol, não tirando os olhos de cima do envelope que entregara a D. Emanuel, na esperança deste o abrir e ele conseguir bispar alguma letra…, uma frase…, que lhe desse uma pista, um elo, para deduzir todo o conteúdo da missiva.
Assim vendia notícias esfrangalhadas o cónego Salvador, um amante de bens imóveis… e do vil metal… …sobretudo, gerando por vezes grande confusão nos media, com a desinformação que enviava para os mesmos umas horas depois.
Mas D. Emanuel não lhe deu chance e repetiu com acento tónico: «boa noite… … Salvador!».

 
A Mensagem

 Assim rezava a mensagem

Sabe-me sua Eminência  profundo cristão, assim como minha mulher Maria DeBolikeime, que muito apreciou a vossa nomeação e vinda para a capital…, em boa hora…, espero ter em vós um conselheiro e aliado fora dos canais políticos.
As trapalhices que o meu governo arranjou nas últimas semanas tiram-me o sono, passo o dia com enxaquecas só de pensar que tenho de continuar a receber o chefe do partido do Centro Social, D. Paulus, discípulo de Maquiavel…, bem pode sua Eminência ajuizar o sofrimento que me atinge o espírito…, isto é…, a alma, ao reunir e estar cara a cara com uma erva daninha.
D. Emanuel ia pensando, para si: «mas o que é que eu tenho a ver com as enxaquecas deste gajo…, … e porque não correu já com essa tropa fandanga…».
Continuava a mensagem: quanto ao mais, diz o ditado, um mal nunca vem só, e acontece que dois aviões de guerra de país desconhecido, sobrevoaram em voos rasantes as Selvagens, ilhas nossas muito amadas, onde me vou imediatamente deslocar, para morrer, caso seja necessário, pela integridade do território nacional e protecção das cagarras. Minha esposa, mulher valente que é, deve acompanhar-me…, como sempre faz para todo o lado onde vou.
Peço, pois, a sua Eminência que me receba ainda esta madrugada tempestuosa…, a partida da missão é muito cedo…, para me ungir com o sacramento da extrema-unção, assim como à restante comitiva, toda ela composta por fervorosos cristãos.
Pedindo a vossa douta atenção, e abnegado patriotismo, ainda ouso ocupar a ilustre e bem pensante cabeça de sua Eminência com outro grave problema que tenho entre mãos e para o qual peço a inestimável ajuda do episcopado, dado que não confio em mais ninguém, que não em sua Eminência. Decorrem as Tercerias da capital entre os estandartes da S. Caetano à Lapa, do Caldas e  do Rato.
«Tercerias…, onde é que eu já ouvi isto» – comentou para si D. Emanuel
Estando o nosso país como está, mais para lá do que para cá…, os rapazes do meu governo andam a brincar ao gato e ao rato, enquanto o povo vai passando ainda mais fome por causa da insensatez e intriga das demissões e das irrevogáveis folhas de papel “à quatro”.
Consegui juntá-los, nessas Tercerias, com os do Largo do Rato, o que eu julgava missão impossível. Mas já percebi que é mais do mesmo, andando todos a ver quem mais engana os seus contrários.
Sobretudo…, deve sua Eminência ter muito cuidado com esse tal D. Paulus que ao pequeno-almoço afirma não gostar de queijo e ao jantar bate meio quilo do Limiano.
D. Emanuel deu uma sonora gargalhada e disse – «chamem-lhe parvo…, só gosta do que é bom!».

 

Epílogo

De manhã veio a bonança e o cónego Salvador ainda tentou tirar nabos da púcara, enquanto tomava o café matinal com D. Emanuel, que lhe respondeu: «senhor cónego…, temos que acertar as contas dos bancos do episcopado…, porque a mim não me batem certas».

AC

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